terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

NÃO SEI

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Van Gogh

Nem sei,
se o caminho
largo e comprido,
que percorri
já acabou...
Creio que não!

J. M. Gonçalves

domingo, 21 de fevereiro de 2010

URBANO TAVARES RODRIGUES

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Urbano Tavares Rodrigues

Biografia:

Nasceu, em Dezembro de 1923, em Lisboa, mas passou a infância
e a adolescência no Alentejo, terra da sua família, que o marcou para sempre como escritor.•
É professor catedrático jubilado da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, membro efectivo da classe de letras da Academia das Ciências de Lisboa, romancista, contista e ensaísta.•
Tem livros traduzidos em quase todas as línguas europeias e até em árabe e japonês. Os seus grandes temas, como ficcionista, são o amor, o tempo, a morte e os problemas sociais.
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sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

JOQUIM CARREIRA DAS NEVES

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Poeta da Vida

À Flor do Verso, de João Magalhães Gonçalves, é um verso maior de uma poesia referencial que é metáfora da Vida: Francisco de Assis, muitos com quem conviveu de perto, e neles descobriu o sorriso, a música sem fim…O poeta vê-se só, mas, paradoxalmente, acompanhado do encanto do narciso, das giestas, do botão da flor (grávido…do desejo de ser flor), do colo, da mãe, da bênção. O poema que melhor o define (se é que isso é possível) é o último: “Voltei, para agradecer”. Grande poema, soberba poesia! Embora só e, apetecendo-lhe fugir, estende “sempre a mão / à procura de mim”. O poeta escreve porque se vê na obrigação de cumprir uma promessa: “Dou conta da herança que recebi em testamento”; “A promessa e um dever:/ regressarei sempre / para agradecer;

Neste agradecimento (eucaristia da Vida), projecta a Bíblia que é o grande livro da Vida: Deus e os homens, esperanças e interrogações, cansaços do deserto e regresso à pátria, à Terra Prometida. O poeta reencontra o Horeb, a“fúria” de Job, a luz do Menino, a Samaritana (Jacob deixara / na memória de todos / um poço /à espera, / na plenitude do tempo, / de água e da vida / que viriam depois…),o Samaritano, os Magos, Belém, Filho Pródigo, “Pai, é eu”… mulheres da Ressurreição, o Cireneu, os discípulos de Emaús (poema extraordinário de existencialismo e dúvida), o leproso que agradece; “Sôbolos rios”, “Nunc dimitis” de Simeão, o pastor e o seu rebanho, “Senhora das Dores”.

Entre as figuras bíblicas e o mundo do poeta, nasce a esperança, a evocação de certezas escondidas, e, entre a floresta, a árvore sozinha, solitária, a precisar de água e raízes…e de uma África longínqua, perdida e sem identidade… perdida também na saudade de longes sem fim.
A esperança da liberdade, adiada, surgirá, a medo, num dia de Abril com a “liberdade desejada, em que os cravos nasciam / e passavam / de mão em mão, / mensagem rebelde e acordada / para um futuro sem nome / incerto / como a chuva de Maio”…

Ninguém pergunte pelo significado da grande música de Beethoven ou Bach. Ninguém pergunte pelo significado da poesia de João Magalhães, porque é poesia. Tudo é evocação, na palavra do poeta que vive os referentes dramáticos de desertos, esperanças messiânicas e vidas anunciadas. O poeta é, assim, mais um eco da realidade, em poesia sublime.

Joaquim Carreira das Neves, O.F.M.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

SONETOS MÍSTICOS - Adelino Pereira

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SINFONIA ALÉM DE MIM

Lúcido ingénuo louco à vela vou
para o país onde não há sois postos
lá realizarei todos os gostos
invisível gaivota ao vento vou.

Nu sem terra sem ouro num fácil voo
cantando a música do sol dos rostos,
matando a sede só com suco e mostos
da terra sou mas ainda lá não estou.

Oásis, paraíso, ilha ansiada
além dos mares brancos dos meus sonhos,
além do tudo mais que eu sou e que é nada.

Além, muito além, sou o que em mim ponho
lúcido ingénuo e louco ao fim do dia
vou sempre muito além da minha sinfonia.

UM SONHO DA TUA MÃO CRIADORA


Eu fui menino, a coisa mais bonita e encantadora,
eu fui criança, a coisa mais formosa e sonhadora,
eu fui pequeno de alma e corpo mais do que uma aurora,
eu fui como uma flor que abre e sabe que desflora.

Eu fui um inocente e um ignorante a toda a hora,
eu fui um caminhante livre pela estrada fora,
eu fui um irmão gémeo da vida madrugadora,
eu fui e sou um homem de alma sempre adoradora.

Eu fui, meu Deus, um sonho da Tua mão criadora,
da Tua mão divina, da Tua mão protectora,
da Tua mão que assegura sempre e que me escora.

Eu fui o que não sei que fui, ó Lume, que em mim mora,
ó Mistério sem tempo, minha eternidade agora,
Vós sois quem me dá vida e minha vida adora.
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O que eu tenho a dizer sobre os “Sonetos Místicos” do Adelino é bastante simples: não me sinto com capacidade suficiente para fazer um juízo pormenorizado sobre esta parte da sua obra. O conteúdo é sem dúvida o de um homem atento a todas as coisas que há na vida e exagera quando faz certas ilações imediatas, com alguma falta de propriedade nas comparações e metáforas . “O que me preocupa é o que me rodeia”, como diz Cesário Verde. Há sequências de sonetos sobre o mesmo tema que, pela sua linguagem menos poética, teriam necessariamente de serem revistos e seleccionados pelo A.. Altera bastante o n.º de sílabas métricas de soneto para soneto. Chego a acreditar que ele nunca terá tido a intenção de os publicar. Disso ninguém terá a certeza. A subjectividade imanente à própria essência da poesia, está por vezes ausente, sobretudo naqueles sonetos em que não temos referências para os analisar, ou são produto dos acontecimentos recentes e marcantes no presente ou no passado. .Não refiro nenhum em particular porque, embora os lesse todos, nunca tive a intenção de fazer uma análise crítica, para o que não tenho competência.. Tentei ajudar, atendendo ao pedido que o Fr. Isidro me fez e não estou arrependido de ter aceite. O Adelino foi um homem de espírito, empenhado, de grande riqueza interior, desprendido, atento a tudo e a todos numa alegria franciscana de pressa e entrega.

João Magalhães

LIVRO

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Outono

Folhas que o vento
inspira
com voz de Outono
caídas
de uma primavera longe
na morte ondulada
do instante que passa
numa dor de alma
sem regresso.